ADVOCACIA, SUBSTANTIVO FEMININO (PARTE II)

AS PRIMEIRAS ADVOGADAS BRASILEIRAS

 

 

Hoje vamos continuar a história da semana passada. Como sabem as mulheres precisaram lutar muito para ter seu valor profissional reconhecido no Direito. Elas sofreram diversos ataques morais para conquistar o seu lugar e poder aplicar os conhecimentos para os quais tanto se dedicaram. No blog passado descobrimos algumas almas inspiradoras… vamos conhecer mais algumas?

Desta vez, conheceremos as primeiras advogadas brasileiras.

1 – Myrthes Gomes de Campos

Myrthes, nascida em Macaé (RJ), em 1875, foi uma mulher importante na história da advocacia brasileira. Além de ser pioneira na luta pelos direitos femininos, defendeu o voto feminino e a emancipação jurídica das mulheres.

As mulheres precisaram lutar muito para poder exercer a advocacia. Em muitas teorias, Myrthes foi a primeira mulher a alcançar tal feito. Ela se formou em 1898, quando cursou a Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro.

Observação importante: outras mulheres já haviam se formado em Recife, mas nenhuma delas conseguiu exercer a profissão. Obviamente não foi fácil para Myrthes. Ela precisou registrar seu diploma na Secretaria da Corte de Apelação do Distrito Federal para obter a inscrição no próprio tribunal, mas os órgãos envolvidos inseriram diversos obstáculos nesse processo.

O próprio presidente da corte não acreditava na capacidade das mulheres e até tentou aconselhar Myrthes a desistir, sendo que ela só conseguiu o registro depois de oito anos tentando. As dificuldades não foram só essas, pois ela sofreu muito para entrar no quadro efetivo da Ordem dos Advogados do Brasil.

Em 1899, ela conseguiu ingressar somente como estagiária. Até que a Comissão de Justiça, Legislação e Jurisprudência defendeu seu direito, já que não existia lei que a proibisse de exercer a profissão. De qualquer forma, Myrthes só conseguiu sua inscrição definitiva em 1906.

Myrthes conseguiu chamar atenção da imprensa quando se tornou a primeira mulher a exercer a profissão de advogada em um tribunal. E ainda conseguiu vencer o caso contra um promotor considerado imbatível.

“É de esperar que a intervenção da mulher no foro seja benéfica e moralizadora, em vez de prejudicial como pensam os portadores de antigos preconceitos”.

(Myrthes Gomes de Campos)

Myrthes, enfrentando a discriminação, venceu obstáculos e colecionou conquistas. Foi nomeada inspetora de ensino do Distrito Federal e se tornou encarregada pela jurisprudência do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, além de outros títulos. Especula-se que Myrthes tenha falecido em 1965, aos 90 anos de idade.

2 – Esperança Garcia

Outra teoria diz que a primeira advogada brasileira foi uma mulher negra: Esperança Garcia. Sabemos que o Brasil, em diversos casos, esconde a história de pessoas inspiradoras, que deram a vida por importantes causas. Umas delas foi Esperança Garcia.

Escravizada, Esperança viveu em Oeiras, Piauí. Tudo começou quando ela enviou uma carta ao Governador, reivindicando a própria liberdade.

Essa história aconteceu bem antes de Myrthes, pois esse documento foi redigido em setembro de 1770. Isso ocorreu na fazenda Algodões, cerca de 300 KM de Teresina, onde Esperança, aos 19 anos, era escrava.

Infelizmente, existem poucos registros materiais de sua vida. Por exemplo: não se sabe como ela foi alfabetizada, já que era raro um escravo ter qualquer acesso à educação. Seu gesto e coragem, de enviar a carta, com uma bela escrita, ao governador de Piauí, Gonçalo Botelho, foi descoberta pelo historiador Luiz Mott em 1979. Abaixo uma cópia da carta no Arquivo Público do Estado.

“Eu sou uma escrava de V.S. Administração do Capitão Antonio Vieira de Couto, casada. Desde que o Capitão para lá foi administrar, que me tirou da fazenda dos Algodões, onde vivia com meu marido, para ser cozinheira da sua casa, onde nela passo muito mal. A primeira é que há grandes trovoadas de pancadas em um filho meu sendo uma criança que lhe fez extrair sangue pela boca, em mim não posso explicar que sou um colchão de pancadas, tanto que caí uma vez do sobrado abaixo de peiada; por misericórdia de Deus escapei. A segunda estou eu e mais minhas parceiras por confessar a três anos. E uma criança minha e duas mais por batizar. Pelo tão peço a V.S. pelo amor de Deus e do seu Valim ponha aos olhos em mim ordinando digo. Mandar a procurados que mande para a fazenda aonde ele me tirou para eu viver com meu marido e batizar minha filha. De V.S. sua escrava Esperança Garcia.” (MOTT, 1985:106)

Talvez o mais antigo documento de uma mulher escravizada reivindicando sua liberdade. A Ordem dos Advogados do Brasil do Piauí decidiu, em 2017, que o texto de Esperança possui nomenclaturas típicas do Direito, então reconheceu a carta como uma petição. Sendo assim, concederam a Esperança Garcia o título de advogada, portanto a primeira advogada do Brasil.

3 – Maria Augusta Saraiva

Uma terceira teoria é a de Maria Augusta, nascida em 31 de janeiro de 1879. Ela marcou a história sendo a primeira mulher a ingressar na Faculdade do Largo São Francisco. E tem mais: ela foi a primeira mulher a atuar no Tribunal do Júri.

Quando se formou em 1902, teve tanto destaque que recebeu um prêmio para viajar à Europa. Ela estreou, como mulher, em uma tribuna judiciária. Conseguiu absolver seu réu homicida em dois casos, tanto na capital, quanto no interior em Jaboticabal.

Maria Augusta Saraiva, Consultora Jurídica do Estado, um cargo de honra, faleceu em 28 de setembro de 1961. Infelizmente, por conta da OAB – Subseção de São Paulo ser fundada em 1932, seu nome não aparece em nenhum registro da seccional paulista, pois à época ela não mais advogava.

Myrthes Gomes de Campos, Esperança Garcia e Maria Augusta Saraiva são nomes importantes não só para a história da advocacia, mas também – e principalmente – como fonte de inspiração para qualquer mulher.

Por hoje acabamos. Gostou de conhecer a história das mulheres na advocacia? Deixe seu comentário.

E diga-nos: sobre qual curiosidade você gostaria de saber na semana que vem?

Até a próxima!

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